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Yoga e Liberdade

Yoga e Liberdade

avatarpor Luciano Giorgio data 15/09/2015

Liberdade é a meta final de todo o processo de yoga. Em geral, pensamos a liberdade de maneira leviana, achando que se trata da possibilidade de fazer o que queremos, o que nos “der na telha”. Essa é uma noção falsa de liberdade, porque o sujeito que quer realizar todos os desejos que passam pela sua cabeça está completamente subjugado por suas fantasias, seus sentidos e seus processos mentais mais superficiais, e pode ser considerado tão livre quanto um escravo, com o agravante de que, no seu caso, o agente opressor é a sua própria mente.

Ser livre enquanto indivíduo é ser capaz de decidir algo levando em conta todas as opções conhecidas e fazendo uma escolha que se considera a melhor possível, sem estar sendo constrangido a agir de outra forma por fatores externos. É interessante investigarmos aqui o que são considerados ‘fatores externos’. Uma pessoa com um revolver apontado para a sua cabeça sendo obrigada a fazer algo é obviamente um fator externo, mas não é sobre isso que o yoga está falando. Aquilo que tem propriamente a capacidade de decidir é chamado no yoga de intelecto, buddhi, a faculdade capaz de discernir as coisas, entender valores e iniciar uma ação. Tudo aquilo que em uma pessoa está subordinado ao intelecto é chamado de fator externo, o que inclui a mente, manas, com as suas impressões de experiências passadas na forma de gostos e aversões e os cinco sentidos.

Quando, por exemplo, eu (intelecto) decido que não vou comer chocolate de noite por razões pessoais de saúde mas, não obstante, o olho vê o chocolate em cima da mesa, a mente traz a memória da satisfação do chocolate, a boca saliva e a mão agarra o chocolate e o coloca na boca – todo esse processo não foi feito propriamente por mim mesmo, mas apesar de mim mesmo. Eu fui como que coagido por fatores externos, e por isso a minha ação não foi uma expressão de liberdade, mas a manifestação de um processo praticamente mecânico de gosto e aversão.

Uma ação livre só é factível se houver para o sujeito certa liberdade com relação aos seus próprios gostos e aversões. Gostos e aversões são tendências mentais, resquícios inevitáveis das experiência de prazer e dor. Sempre que algo é experimentado como bom e agradável, uma tendência de buscar novamente aquela experiência e os meios que a produziram fica gravada na mente, o que então constitui um gosto. Ao contrário, sempre que algo é experimentado como ruim, desagradável ou doloroso, uma tendência de evitar aquela experiência e os meios que a produziram fica gravada na mente, o que então constitui uma aversão.

Segundo o yoga, uma ação só é livre quando não está sendo determinada exclusivamente pelos gostos e aversões do sujeito. O intelecto deve poder avaliar os gostos e aversões à luz de coisas mais importantes como, por exemplo, princípios pessoais de integridade, responsabilidade, etc., e então decidir se a satisfação daqueles gostos e aversões imediatos comprometerão ou não a observação desses princípios. Caso não comprometam, então é claro que a escolha será de acordo com o gosto ou aversão, por que não seria?

Essa integridade pessoal, contudo, é bastante difícil de ser seguida, porque com relação a algumas situações da nossa vida os nossos gostos e aversões sequer são evidentes para nós e, agindo de modo subconsciente, tornam-se simplesmente fortes demais. É realmente muito comum fazermos coisas contrárias ao que faríamos livremente, pressionados por impulsos que não fazem nenhum sentido se analisados racionalmente. Quantas vezes não somos coagidos a aceitar algum convite ou fazer alguma coisa que não estamos realmente dispostos a fazer, apenas por uma necessidade de agradar a outra pessoa e garantir que ela goste de nós, como se tivéssemos qualquer responsabilidade com relação ao bem-estar da pessoa ou, pior ainda, como se o nosso ‘não’ fosse fazer ela deixar de gostar de nós. Essa são crenças errôneas, fantasias nascidas dos nossos gostos e aversões formados provavelmente na primeira infância, quando vimos nossos pais irritados ou tristes e concluímos que tínhamos os desapontado por alguma coisa que fizemos, ou algo do tipo.

Assim,  é difícil realizarmos uma ação realmente deliberada, livre, porque não conhecemos os mecanismos dos nossos gostos e aversões. E, mesmo quando os conhecemos, ainda assim a força deles é tão grande que podemos sucumbir diante deles e acabar fazendo algo que não devíamos, o que inevitavelmente nos deixa com sentimentos de culpa, raiva e frustração, que em geral só reforçam os mesmos mecanismos que os geraram.

Uma vida de yoga é uma vida que visa uma liberdade relativa com relação aos gostos e aversões e, por isso, é uma vida de disciplina. É preciso, em primeiro lugar, estarmos atentos no nosso dia-a-dia para percebermos esses mecanismos automáticos de reação ao mundo, que frequentemente agem contra a nossa felicidade. Esse é um motivo pelo qual a prática de asana e pranayama é bastante necessária, principalmente no começo, pois nos proporciona calma, bem-estar e sutileza mental necessários para conseguirmos nos perceber no meio das situações concretas em que nos encontramos a cada momento. Uma vez conhecidos os principais padrões de reação é necessário começar a agir de forma oposta, o que demanda muita coragem e determinação, pois é muito difícil ir contra padrões tão estabelecidos e com as quais temos uma forte ligação emocional. A nossa sorte é que a satisfação de poder agir sem ser coagido por noções irreais e fantasias é tão grande que começamos a tomar gosto por essa prática, e então todo o processo deixa de ser um suplício e vai ficando cada vez mais fácil. Até que o novo comportamento se torne ele mesmo um “padrão natural”, e, então, não precisamos mais fazer esforços para sermos nós mesmos. Nesse momento, podemos dizer que estamos agindo livremente.

 


Esse texto foi escrito por Luciano Giorgio, do VedantaLife.

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